Teodoro, o porco, e Cristóvão, o pato, em: fugindo da ceia do natal.


Já era dez de dezembro e, aos pouquinhos, o dia teimava em nascer. Logo, os primeiros raios de sol tocariam as montanhas cobertas por neve e formariam um lindo espetáculo de luzes. Neste dia, o galo Garnizé nem precisou cantar no poleiro para acordar a fazenda, pois todos os animais haviam se reunido para reverenciar aquela manhã. Todos eles estavam alvoroçados, já que na noite anterior houve a festa de fim de colheita, uma noite dedicada a celebrar os frutos de um ano de trabalho. Eu disse todos? Na verdade, quase todos, já que um animal triste e rechonchudo optou por não sair da cama. Seu nome... Se não me engano era Teodoro, pobre porco Teodoro! Diferente dos outros, Teodoro não tinha motivos para alegrar-se, já que dias atrás, seu irmão mais gordo foi abatido para servir de refeição para os convidados da festa. Teodoro sentiria saudades eternas de Inácio, porém a razão maior de sua tristeza era ser o porco mais gordo do chiqueiro e saber que faltavam apenas quatorze dias para o natal. Pobre Teodoro seria o seu destino servir de ceia para o natal?
Cristóvão, o pato, era o melhor amigo de Teodoro e apenas tinha comparecido a festa da colheita para não contrariar a sua namorada, já que anos atrás um dos seus irmãos também foi abatido para se tornar o prato principal da ceia. Sendo assim, logo, depois despedir-se de sua amada Cristóvão apressa seus passos desengonçados e segue em direção ao chiqueiro. Agora após suportar a festa, animar Teodoro se tornou sua mais nova missão.
_ Teodoro, onde você está?
_ Aqui no canto, amigo.
_ Sabe que sei como se sente, mas vamos sair um pouco! Dar uma volta te faria bem.
_ Não sei, melhor ficar aqui e comer.
_ Assim só vai engordar mais e fazer a alegria dos humanos.
_ O que importa? Serei abatido de qualquer forma mesmo.
_ Sai dessa, ainda faltam quatorze dias e podemos dar um jeito de você escapar dessa.
_ jeito, que jeito?
_ É... E se você emagrecer!
_ É, emagrecer. Pode me fazer emagrecer, pato?
_ É... Poder não posso, mas sei quem topa te ajudar. Vamos falar com Veloz, o cavalo.
E assim, convencido pelas palavras do amigo Teodoro se anima para deixar o chiqueiro. Naquela mesma tarde, saíram os dois a procura de Veloz e perguntaram sobre seu paradeiro a todos os animais da fazenda, mas não conseguiram uma resposta. À noite já começava a cair e Teodoro e Cristóvão voltavam a casa questionando o que teria acontecido a Veloz. Talvez tivesse sido vendido por seu Jonas, dono da fazenda, ou, quem sabe tivesse quebrado a pata enquanto galopava pelos pastos. Bem, o fato é que Teodoro estava realmente desanimado e caminhava distraído quando, de repente, tropeçou em uma pedra. Teodoro ainda se recuperava da queda quando ouviu o som de uma forte risada vindo de frente da casa dos humanos. Era Veloz que sem vergonha não agüentou conter a gargalhada ao ver o porquinho cair. Ainda aos risos Rufos falou:
_ Acho melhor você olhar por onde anda porquinho.
Contente por ouvir tais palavras Cristóvão grasnou de felicidade e foi logo conversar com Rufos, esquecendo-se até de ajudar o porquinho a se levantar.
_ Quem é vivo sempre aparece, Rufos.  Era você mesmo que estávamos procurando.
_ Tive que levar o humano à cidade e só voltamos agora. Mas, o que querem comigo?
Ainda se recuperando da queda Teodoro entra na conversa.
_ Bem, é que eu preciso perder peso e o Cristóvão me disse que você poderia me ensinar a correr.
_ É, você está realmente gorinho, mas ensinar a correr...
Aflito diante de uma possibilidade de recusa Cristóvão grasnou, novamente, só que desta vez de raiva. E a seguir falou:
_ Caso de vida ou morte, ou, o porquinho aqui emagrece ou vai para a panela no natal.
Ao ouvir sobre o drama do porquinho veloz logo se comoveu e disse:
_ Sendo assim eu vou ajudar, estejam amanhã às 08:00 em frente ao estábulo.
E na manhã seguinte, repleta de confiança, lá estava a dupla inseparável. Já, Veloz esperava por eles com a animação típica de um valente puro sangue. E foi com este ânimo que os treinamentos logo começaram. Auxiliado por Cristóvão Teodoro realizou um aquecimento desengonçado e a seguir se posicionou na marca de início da corrida. Como professor consciente Veloz resolveu não cobrar tanto do porquinho, e assim partiram ambos numa marcha lenta. Mas, ainda assim parecia que as pernas curtas de Teodoro não eram capazes de cumprir tal tarefa, já que, logo, após alguns metros se tornaram freqüentes as suas quedas. Deste modo não havia outro jeito e a melhor solução foi interromper os treinos. E assim decepcionado por não poder ajudar o colega restou ao cavalo apenas desejar boa sorte.
_ Boa sorte, amigos. E não desistam!
Sem perder as esperanças Cristóvão grasnou meio sem jeito e a seguir tentou animar o porquinho.
_ Quer saber, é isso mesmo! Desta vez iremos sair daqui, acho que conheço alguém que pode nos ajudar.
Como de costume, às 06:00 da manhã, o galo Garnizé já se aquecia começar o seu solitário espetáculo de subir no poleiro e cantar para anunciar o novo dia, mas desta seu serviço sofreria um pequeno atraso, pois Cristovão e Teodoro já estavam lá de plantão a sua espera.
_ Ora essa, o que vocês fazem aqui esta hora, amigos?
Cristóvão ainda estava roçando o bico nas penas para se aquecer, mas, logo, que ouviu as palavras de galo se apressou em responder.
_ Precisamos de ajuda, Garnizé. Em breve chegará o natal e para não virar ceia o Teodoro aqui precisa escapar.
_ Sim, mas como posso ajudar vocês?
Desta vez esforçando para quebrar sua timidez costumeira Teodoro interrompe a conversa dos amigos e diz:
_ É que... É que todo mundo na fazenda comenta seus antigos feitos, que serviu na guerra dos galos como piloto de avião. Isso é verdade?
Considerando a pergunta uma afronta Garnizé se impõe no poleiro e diz:
_ Se é verdade? Mas é claro que é verdade, foi há muito tempo, quando os frangos ainda eram donos de sua própria nação. Foi nesta guerra que perdi um olho, mas ainda posso pilotar perfeitamente.
Animado com a resposta do galo Cristóvão, logo, solta a pergunta chave.
_ Então pode nos ensinar a construir um avião para ajudar o Teodoro a escapar da fazenda.
_ Se posso... Sim, acho que tenho um manual de engenharia perdido em algum lugar. Mas, o avião não vai subir com muito peso, e por isso o porco precisa aprender a pilotar. Hoje à tarde mesmo sairemos em busca dos materiais.
Apesar dos receios de Teodoro em aprender a pilotar foi com extrema felicidade que ambas as partes fecharam o acordo. E assim, logo à tarde, saíram os três perambulando pela fazenda em busca de materiais, mas é claro que devido à carência de recursos foi preciso improvisar.  Logo, no primeiro dia de buscas nossa dedicada equipe de construtores conseguiu recolher uma pequena cadeira de bebê para ser utilizada como assento. Já, as rodas do veículo, estas seriam nada menos do que as rodas de um velho carrinho de feira. Neste dia recolheram também pregos, parafusos e uma ferradura de cavalo (presente do Veloz) que serviria de leme.
 Mas, nos dois dias seguintes, a dificuldade maior estava em encontrar o material adequado para construção do corpo da aeronave. Sendo assim, após muita discussão resolveram utilizar a madeira de alguns caixotes que encontraram abandonados no celeiro. Já, o quarto dia foi inteiro dedicado a confecção da aeronave. Logo, após muito suor e noites de sono perdidas foi na manhã do quinto dia que Teodoro, Garnizé e Cristóvão puderam apreciar a vista magnífica de sua linda aeronave concluída.
Como durante todo o processo de construção da aeronave Teodoro teve aulas de pilotagem Cristovão decidiu que o melhor seria decolar de madrugada enquanto todos os humanos estivessem dormindo.   E assim foi, às 0130 da madrugada, Teodoro, Cristóvão e o galo Garnizé seguiram com o avião até a maior colina da fazenda, local onde seria realizada a decolagem. Fazia frio naquela madrugada e, aos poucos, o vento começava a soprar mais forte e assim à medida que os galhos das árvores balançavam mais o medo crescia no coração de Cristóvão e Teodoro. Enquanto isso Garnizé seguia falante, contando histórias de seus gloriosos dias de pilotagem. Logo, assim que eles chegaram ao topo da colina Cristóvão conferiu os equipamentos e encorajou o porquinho a subir no avião.
_ Você consegue!
A seguir Garnizé começou a dar as instruções de vôo.
_ Aperte os cintos, Teodoro. Ligue o motor, confira o nível do óleo, puxe o leme e...
De repente, num piscar de olhos, o avião deu um estalo e começou a percorrer a pista improvisada na colina. Alguns segundos depois, e já estava feito o avião levantou vôo e começou a planar, timidamente, pelo ar. Garnizé e Cristóvão ficaram maravilhados ao contemplar a grandiosidade daquela cena, um porquinho a pilotar um avião pelos céus da fazenda. Mas, não demorou muito e os primeiros problemas se apresentassem ao piloto iniciante. Devido a uma rajada mais forte de vento uma das asas do avião foi danificada e assim, rapidamente, a aeronave começou a perder altitude.  Cristóvão e Garnizé que antes, acenavam sorridentes para Teodoro se encheram de preocupação. Mas, por sorte Teodoro era um porquinho esperto e conseguiu evitar uma queda maior ao guiar o avião até que se chocasse com a copa de uma grande árvore, local onde ficou agarrado.
 Pois é, cinco dias de trabalho duro foram jogados fora. Teodoro estava vivo, mas triste, afinal, o natal estava se aproximando. Mas, apesar dos contratempos Cristóvão estava decidido a não permitir que Teodoro desanimasse, para isso foram precisos muitos argumentos até que o porquinho se sentisse disposto a sair do chiqueiro e retomar os planos.
Foi na tarde do sexto dia que Cristóvão, Teodoro, Veloz e Garnizé decidiram fazer uma reunião e elaborar uma lista com os nomes dos animais da fazenda que poderiam ajudá-los. Ao final da reunião Cristóvão já possuía novos planos e contava com o apoio de Veloz e Garnizé para conseguir a ajuda dos outros animais. Mas, à proporção que os dias se passavam apenas aumentava o número de recusas que a equipe recebia. Alguns animais pregavam que Teodoro devia aceitar o seu destino de porco e por fim ser abatido no natal, afinal, o dever do animal era servir ao homem. Já outros apenas alegaram apenas não possuírem tempo, as vacas disseram que não poderiam interromper a produção de leite, os bois não podiam largar a sua função de arar a terra.
E assim, inúmeras vezes, Teodoro assistiu ao sol dar lugar a lua, sabia que seu tempo estava se esgotando, mas ainda tentava manter a esperança.  Certo dia Garnizé voltou com a notícia de que Tristão, o burro, queria ajudá-los na fuga.  Auxiliado por Veloz Tristão, que era conhecido por sua força, golpearia a resistente cerca da fazenda até quebrar. Infelizmente, tal plano não foi posto em prática, pois na tarde daquele mesmo dia o burro adoeceu.
Já, com um prazo de dois dias para o natal Teodoro já havia se conformado com a sua morte. À tarde Teodoro e Cristóvão tinham se encontrado embaixo de uma grande mangueira, Teodoro desejava deixar alguns de seus pertences ao amigo. Assim que os amigos se encontraram lágrimas rolaram de seus olhos, como era pesado o fardo da despedida, porém foi exatamente neste instante que avistaram Garnizé se equilibrando na garupa de Veloz que corria às pressas. Ambos pareciam animados e antes mesmo de chegar à árvore, aos berros, deram as boas novas.
_ Teodoro, esqueça o natal... Você não morrer!
Surpreso Teodoro ainda espera os amigos se aproximarem para entender o porquê daquele reboliço.
_ Mas,... Mas, como assim não?
Logo, Veloz e Garnizé juntos tratam de dar a notícia.
_ Elizabeth, a filha do seu Jonas, teve um ataque cardíaco numa ida à cidade. Depois do susto os humanos da fazenda decidiram se tornar vegetarianos.



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